Carta Aberta aos Bispos da Paraíba





João Pessoa, 14 de dezembro de 2009

Prezados Srs. Bispos da Igreja Católica Romana da Paraíba,


         Foi amplamente divulgada pelos meios de comunicação do Estado seu encontro com o Governador José Maranhão – inclusive com emblemática foto (na qual aparece, ao centro, o Governador, ladeado pelos Srs.).
         Pela declaração prestada, em entrevista, por Dom Aldo Pagotto, falando em nome dos Srs., tratava-se de uma “visita de cortesia”, na qual foram abordados temas como parceria entre Igreja e Estado, turismo religioso, transposição das águas do Rio São Francisco.
         Não bastasse o estranhamento da iniciativa - justo num contexto de efervescência pré-eleitoral - os pontos de pauta divulgados não parecem expressar um consenso, nem no âmbito da sociedade civil organizada, nem ao interno da própria Igreja Católica.
         Diante desse fato, resolvemos, como cidadãos e cidadãs e como cristãos e cristãs, dirigir-lhes respeitosamente algumas ponderações, em forma de perguntas:

- Fazer visitas é um belo hábito entre os humanos, inclusive entre os cristãos – sobretudo quando realizadas sob o manto da gratuidade e desprovidas de interesse. No caso em apreço, aliás, não se tratou de encontro de apenas um dos Senhores com o Governador. Foi um encontro ou uma”visita de cortesia” coletiva feita ao Governador pelos bispos da Província da Paraíba. Tendo em vista o lugar privilegiado que os pequenos (e não os poderosos!) sempre ocuparam na agenda missionária de Jesus (“O Espírito está sobre mim... – Lc 4, 16-19”, “Eu Te bendigo, ó Pai, porque revelaste essas coisas aos simples e pequeninos... – Lc 10, 21), ocorre-nos indagar-lhes se esse tipo de encontro ou visita também se tem feito coletivamente pelos Srs. Bispos da Paraíba aos assentamentos rurais, às comunidades indígenas, às comunidades quilombolas, às prisões, em breve, às ovelhas desgarradas da Casa de Israel? Ou não é essa a atitude que devemos esperar de pastores, a exemplo de Jesus, que vivia como pobre no meio dos pobres, e tão pouco dado a encontros ou visitas aos poderosos do seu tempo?

- Com relação aos pontos tratados, também temos algo a ponderar. Um deles foi o Projeto de Transposição das águas do São Francisco. Não é um tema em torno do qual haja um amplo consenso entre as bases da sociedade civil, nem mesmo dentro da Igreja, haja vista a resistência firme oposta aos projetos faraônicos, não de hoje, pelas comunidades indígenas, quilombolas, de pescadores, da CPT, dos atingidos por barragens, entre outros, sem falar em figuras do próprio episcopado com discordância aberta sobre o mesmo Projeto. Os Srs. acham, em sã consciência, que este ponto de pauta merece ser tratado desse modo por quem tem o ofício de pastores, precisamente numa conjuntura tão conturbada, inclusive eleitoralmente, em que o próprio Governador é anunciado como candidato? Estando os Srs. de acordo com o tal Projeto, dadas as resistências de parte significativa do seu próprio rebanho e até de outros irmãos pastores, por que não deixar o enfrentamento mais direto a cargo das forças populares e dos leigos e leigas, em vez de tomar a frente, num caso que deve ser protagonizado por leigos e leigas? Ao assim procederem, os Srs. não perdem força ética, ao cobrarem dos seus padres que não façam política partidária?

- Quanto ao desenvolvimento do turismo religioso, tendo em vista que uma coisa é ser administrador ou gestor de uma instituição, e outra bem diferente é o ofício de pastor, indagamos aos Srs. se lutar por turismo religioso é mesmo uma prioridade de agenda de pastores seguidores do Evangelho? Sem falar na cobrança de isonomia (devida pelo Governo), feita, a justo título, por membros de outras igrejas e expressões religiosas da Paraíba, tal gesto não ecoa como uma busca de tratamento privilegiado, na distribuição dos recursos PÚBLICOS? E sem esquecer, ainda, que nem todos os católicos estão de acordo com a participação de seus bispos nesse tipo de “parceria”, já que evoca vestígios de uma associação espúria de triste memória: a famigerada aliança entre o poder temporal e o poder eclesiástico, aliás evocado, em outros termos, na declaração de Dom Aldo?

         Estamos em tempo de Advento, em que ressoa forte a voz dos profetas, chamando-nos à conversão. De que modo um episódio como esse, protagonizado pelos Srs., ajuda-nos no processo de conversão, na perspectiva do Seguimento de Jesus? Tomara que a reconsideração de fatos como esse nos faça, a todos, mais abertos e solícitos ao que o Espírito tem a dizer à nossa Igreja, aos nossos pastores e a cada um, cada uma de nós.

Fraternalmente,




Alder Júlio Ferrreira Calado

Rolando Lazarte

Luiz Gonzaga Gonçalves

João da Cruz Fragoso

Flávio Rocha

Antônio Alberto Pereira

Renato Lanfranchi

Valdênia A. Paulino Lanfranchi

Elias Cândido do Nascimento

Maria Angelina de Oliveira

Eugênio Costa Mimoso

José Hailton Bezerra Lyra

Luciano Batista Bezerra Souza

Ulisses Willy Rocha de Moura, Secretário do CEBI (Regional Nordeste)

Romero Venâncio Júnior

Ricardo Brindeiro

Magdala Cavalcanti Melo

Guy Maurice Norel

José Jonas Duarte Costa

Solemar Sena

Luciana E.F.C. Deplagne

Eliana A. de F. Calado

Germana Alves Menezes

Ir. Ana Célia Silva Menezes

Emanuelson Matias de Lima

Gleyson Ricardo

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