MEIO AMBIENTE: A DÍVIDA FRANCESA COM O BRASIL, POR ANTONIO JORGE MOURA

A cidade de Boquira, na Chapada, berço da exploração francesa Foto: Boquira on line

Aproveitando uma provável visita do presidente Lula a Salvador, em 20 de novembro próximo, Dia Nacional da Consciência Negra, para assinar documentos de reivindicação dos mais expressivos e históricos Terreiros da tradição religiosa e cultural afrodescendente - Bogum, Casa Branca, Oxumaré, Gantois, Opô Afonjá, Alaketo - (faltaram ser ouvidas a casa de Luizinho da Muriçoca, imortalizada na literatura de Jorge Amado, o Ilê Asipá, do Mestre Didi, e os templos de Santo Amaro da Purificação, Saubara, Cachoeira, São Félix, Muritiba, além das casas da Chapada Diamantina)  abordo um assunto relevante.
 
  O presidente da França, Nicolay Sarkosy, esteve recentemente na Bahia a convite do presidente brasileiro e não ficou sabendo que o país europeu tem uma enorme dívida ambiental com o Recôncavo baiano e a Baía de Todos os Santos.

  Caminhando pela orla de Amaralina, a jornalista Carmela Talento, mãe extremosa de três de meus cinco filhos, me ordenou: escreva sobre isso. E aqui estou eu, debruçado sobre os teclados de minha máquina de escrever metida a besta - o computador de casa - cumprindo as ordens da mãe de Bruno, Silvana e Daniel.

  O amigo francês do Presidente Lula talvez nem soubesse o que ocorreu por aqui, o crime ambiental provocado pela ganância do capitalismo francês. Esse assunto, aliás, pode servir para o chanceler Celso Amorim caso a França engrosse o caldo na próxima reunião da cúpula mundial para discutir as questões ambientais do planeta Terra.

  Minha história começa nos anos 70 do século passado quando o histórico economista Rômulo Almeida, de quem tive a hora de ser assessor de imprensa, me contou a sobre a chegada dos franceses a Boquira, no sertão da Bahia.

  Nessa época do desembarque bem sucedido dos franceses mundo estava em plena II Guerra Mundial, vivendo o esforço dos aliados para vencer a Alemanha nazista, quando descobriram umas amostras de minério de chumbo num museu francês de história natural, nas quais estava a identificação de que se tratava de minério encontrado no Nordeste brasileiro.

  A Franca precisava fabricar munição para vencer as forças nazistas. E os pesquisadores franceses resolveram vir ao Nordeste do Brasil dar uma busca para encontrar a dita mina. Passaram pela Bahia e por diversos estados da Federação sempre usando a mesma tática. Como então os caminhos do Brasil eram percorridos pela via férrea, não existiam estradas asfaltadas, saíram por aí e aqui procurando informações. Claro tendo a cautela de não revelarem o porque do interesse.

  Acabaram passando por Boquira, depois da região de Jequié e Conquista, exibiram as amostras de minério ao farmacêutico local, que olhou e viu algo familiar: "Ah, é das pedras que o povo daqui cata no Natal para armar o presépio. Tá cheia delas".

  Os franceses não falaram nada sobre as pedras e pediram para ir no local porque, na França, um país católico, eles tinham a tradição de montar presépio para as festas natalinas. Deram nova busca e voltaram entusiasmados a Paris. E começaram a operação de transporte do minério que aflorava espontâneamente na superfície, usandoe um forma também muito esperta.

  Pediram para coletar as pedras, fazer algumas escavações e transportá-las em composições de trem de carga para Salvador. No Porto de Salvador, sempre davam uma forma de navio de bandeira francesa atracar e, com a justificativa de que precisavam dar lastro à embarcação para que não naufraugasse em alto mar, colocavam as pedras xx e atravessavam o Atlântico com as futuras balas que iriam derrotar os nazistas.

  Ao mesmo tempo, providenciaram junto aos amigos que fizeram em Boquira para que pedissem o governo brasileiro a concessão do direito de lavra da gigantesca mina de minério de chumbo que já haviam pesquisado.

  Assim, a Bahia e o Brasil participaram do esforço de guerra dos aliados da II Mundial para derrotar a Alemanha de Hitler.

  Passado o conflito bélico os franceses chegaram à conclusão de que não precisavam mais transportar o minério para a Europa e decidiram instalar uma usina de processamento do metal. E escolheram próximo à borda da Baía de Todos os Santos o local para instalar a usina e lançar os dejetos do processo industrial. A estrada de ferro passava em Santo Amaro da Purificação, onde tinha um rio, o Rio Subaé, que desaguava na Baía.

  Aí montam a Companhia Brasileira de Chumbo (Cobrac), hoje, felizmente, fechada, sem operar, mas com suas marcas presentes na terra de Caetano, Bethânia, Jorge Portugal e de Dona Canô.

  Na década de 70 do século passado, quando o pesquisador Oscar Nogueira, do Instituto de Química da UFBA, encontrou presença de chumbo, cádmio e zinco nas águas do Subaé, estimou-se que a Cobrac havia lançado no rio e, consequentemente, na Baía de Todos os Santos, mais de 400 toneladas dos três metais.

  E a limalha sólida do processo industrial era usada para fazer aterros e nivelar ruas em Santo Amaro, expalhando a poluição pela zona urbana da cidade. Centenas de trabalhadores da Cobrac contraíram saturnismo, doença causada pela ingestão de chumbo pelas vias respiratórias.

 Esse é o passivo ambiental deixado pelos franceses na passagem deles pela Bahia depois da II Guerra Mundial, além do enorme buraco da mina de minério de chumbo de Boquira.

  O detalhe é que a mineração de Boquira e a usina Cobrac foram do Grupo Penarroya, de capital francês, pertencente a uma família de nobres franceses, a Família Rotchild.

  Taí uma boa oportunidade do Presidente Lula reivindicar do Presidente Sarkozy uma indenização às famílias de Santo Amaro e de Boquira afetados pelo Grupo Penarroya. E que a França ajude o governo Brasileiro a despoluir a Baía de Todos os Santos, as águas onde nasceu o Brasil. Ou ajuda ou esse é um assunto que as autoridades brasileiras podem levar ao Tribunal Internacional de Haia. Ou não? Vai ficar por isso mesmo? O Brasil é a latrina do mundo desenvolvido?
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Arquivo do blog