“Com governo ninguém pode”: um olhar a partir do Nordeste sobre os desafios para os movimentos sociais do campo

Por: Ruben Siqueira
“O sistema só tolera / Dois tipos de componentes:/ Os tiranos que exploram 
E os subservientes. / Os que lutam por justiça / Serão sempre dissidentes.”
(Fábio Mozart, Biu de Pacatuba - Um herói do nosso tempo )
Caminhões a carregar terra fazem 170 viagens por dia, dizem os moradores; detonações na rocha cristalina, predominante no subsolo nordestino, produzem abalos que derrubam forros e racham paredes de casas; um ancião diz não dormir desde que tudo isso começou há quatro meses, passa a noite tossindo por causa da poeira; a escola foi transferida para uma casa apertada e precária; audiências judiciais em inédita rapidez “resolveram” as questões de desapropriação de terras, mas há descontentamento de proprietários e arrependimento de posseiros; os empregos prometidos são por pouco tempo, para os de fora e muito aquém da demanda suscitada; foram destruídas cisternas de placa, construídas em parceria com o governo federal, usadas para captar águas de chuva do telhado das casas, suficientes para consumo humano de uma família de cinco pessoas; empresários da irrigação se animam com a expectativa de expandir seus negócios; todos parecem saber que a água será cara e terão que pagar por ela, mas crêem que o governo vai facilitar as coisas; são raras as vozes críticas e quase nenhuma entidade se preocupa com a população impactada; a igreja católica está omissa ou alinhada a políticos na frente de apoio ao projeto; a impressão geral é de caos, mas a maioria das pessoas está entre resignada, desconfiada e esperançosa...
Isto está ocorrendo na comunidade de Quixabinha, município de Mauriti, no Ceará, uma vila remanescente da construção do açude (32 milhões de m3) e do perímetro irrigado (513 hectares) pelo DNOCS – Departamento de Obras Contra a Seca, em 1967. São 83 as famílias já removidas ou a serem removidas de suas casas e roças. As obras são da transposição de águas do Rio São Francisco para o chamado Nordeste Setentrional, que abrange os estados do Ceará, Paraíba, Rio Grande do Norte e Pernambuco.
A situação de Quixabinha é exemplar do que o 3º Mutirão das Águas encontrou, entre 26 e 30 de novembro de 2009, ao longo do trajeto dos canais dos dois eixos – Norte e Leste – do projeto de transposição 2. A iniciativa reuniu 53 militantes de movimentos populares e organizações sociais articulados nestes estados e na bacia do São Francisco na luta contra o projeto 3. Tinha como objetivo conhecer a realidade alterada pela imposição do projeto e dialogar com a população sobre ela, introduzindo os elementos críticos sonegados pela propaganda oficial sobre a obra. Ao contrário dos dois mutirões anteriores, foi mínima a participação dos movimentos da Via Campesina. O governo pretende tudo resolver assentando 703 famílias em 18 VPRs – Vilas Produtivas Rurais, o novo nome das “agrovilas”; a impressão dos “mutirantes” é de que são maiores e mais diversos e sobre mais pessoas os impactos negativos diretos e indiretos.
O caso da transposição e da reação ou ausência de reação – conformismo e resistência 4 – ao projeto e seus impactos serve aqui de introdução a esta reflexão sobre o quadro atual e os desafios das lutas populares e dos movimentos sociais do campo, com um olhar a partir do Nordeste. Para este enfoque regional específico, partimos do pressuposto de que o Nordeste é estigmatizado pelo discurso da seca, que, baseado na suposta inviabilidade climática, visa sustentar, com relativo sucesso, a indústria, a política e a cultura da seca. E que isto, sendo uma estratégia regional de poder, tem historicamente funcionalidade nacional e mais ampla, que se recicla na contemporaneidade, na medida em que as elites se internacionalizam e encontram nos governos federal e estaduais sustento e incentivo. Parece-nos que, nos moldes limitantes atuais, subjugada está a sociedade brasileira, em geral e em especial no campo nordestino. Aqui, na melhor tradição de luta do povo da região primeira do Brasil, vinha-se de intensa atividade propositiva e mobilizadora, que se desencaminhou sob as políticas neoliberais, já no Governo FHC e mais no Governo Lula, sob a hegemonia do “lulismo”.
Neste contexto os movimentos populares e organizações sociais do Nordeste perderam a força capaz de modificar as relações sociais e ambientais no campo, opressivas e insustentáveis, no sentido da democracia agrária e da Convivência com o Semiárido, que significariam, no mínimo, cidadania política e justiça social e ambiental. No máximo, caminho para transformações mais profundas, estruturais. As exceções – e há – não alteram a regra, infelizmente.
Os desafios são maiores do que antes, quando a “esquerda” apenas aspirava ao poder do Estado, e a sociedade se via dele separada. E não havia ameaças de tão grande perplexidade como são as mudanças climáticas – seus impactos diretos sobre o Semiárido com a elevação da temperatura, aumento da desertificação e queda da vazão do Rio São Francisco – e as falsas respostas que se pretendem dar a elas sem abnegar de suas causas identificadas no irrefreável expansionismo neocapitalista.
Parâmetro da Convivência com o Semiárido
O Semiárido Brasileiro é a região de quase 1 milhão de km2, que abrange 1.133 municípios e corresponde a quase 90% do Nordeste e mais a região setentrional de Minas Gerais, totalizando uma população de mais de 21 milhões de pessoas, 11% da população brasileira. O Nordeste todo, com 53,5 milhões de habitantes, representa 28% da população brasileira e tem quase a metade dos pobres do Brasil; por isso recebe 52% do “Bolsa-Família”, algo em torno de R$ 5 bilhões. 
Mesmo no auge da SUDENE, em que a economia nordestina cresceu mais que a nacional, a situação dos pobres não melhorou. Mesmo atualmente, com a alavanca operada pelo crescimento econômico nacional, que repercutiu favoravelmente na região, o quadro de dependência econômica e social não se modificou substancialmente. Os equivocados caminhos desenvolvimentistas não fazem bem ao Nordeste, menos ainda ao Semiárido.
Crítico desta trajetória, o professor da UNB – Universidade de Brasília, Roberto Marinho Alves da Silva, distingue três concepções de desenvolvimento da Região Semiárida:
“combater as secas e os seus efeitos; aumentar a produção e a produtividade econômica na região, sobretudo com base na irrigação; e conviver com o Semiárido, combinando a produção apropriada com a qualidade de vida da população local” 5.
As três concepções co-habitam nas políticas públicas atuais e, a despeito dos avanços, predomina a perspectiva que mescla combate à seca com produtivismo econômico baseado na irrigação voltada para exportação, para o que o Estado continua a promover grandes obras hídricas como a transposição.
No entanto, segundo o professor, nesta região se operava uma das mais avançadas tentativas de tornar sustentável o desenvolvimento no Brasil, um emergente “novo paradigma civilizatório”:
“(...) a sustentabilidade do desenvolvimento, como um novo paradigma civilizatório, vem sendo traduzida na proposta de convivência com o Semiárido, orientando um conjunto de medidas socioculturais e econômicas capazes de modificar os padrões de apropriação, reprodução e gestão dos bens e recursos disponíveis, com a finalidade de transformação das condições de vida da população sertaneja” 6.
A significar e propor este paradigma, forças sociais propositivas e empreendedoras de uma rica diversidade de experiências de convivência congregaram-se, em 1999, na ASA – Articulação do Semiárido Brasileiro, que chegou a reunir mais de 700 entidades do mais amplo espectro da sociedade civil. A ASA tenta fazer do processo de construção das cisternas familiares de água de chuva, através do P1MC – Programa Um Milhão de Cisternas, mote de um processo educativo e mobilizador para a Convivência com o Semiárido. Até 13/11/2009, foram construídas 286.519 cisternas.
Com a transposição de águas do Rio São Francisco na pauta, apresentada como solução para a seca – a sede de 12 milhões, segundo a propaganda oficial – setores da ASA, baseados no sucesso do P1MC e inspirados em experiência do semiárido chinês 7, propuseram, no início do primeiro Governo Lula, que com os recursos da transposição se implementasse o P1+2. O Programa “Uma Terra e Duas Águas” visava que as famílias camponesas do Semiárido Brasileiro se mobilizassem para ter uma porção suficiente de terra e formas adequadas de captação e manejo de água para consumo humano e produção agropecuária 8.
Estes programas originários, de iniciativa da sociedade civil, com forte pertinência sócio-ambiental e político-cultural, baseavam-se em três argumentos fundamentais. Primeiro, que o Semiárido tem as águas suficientes para um desenvolvimento sustentável capaz de interagir favoravelmente com a natureza específica da região e proporcionar vida digna para sua grande população rural. Segundo, que o problema maior do Semiárido não é água, mas terra, já que predominam o latifúndio e o minifúndio, quando de acordo com a EMBRAPA são necessários no mínimo 300 hectares para uma família viver bem e sustentavelmente na região 9. Terceiro, que o maior déficit nordestino é o de poder político popular, o que requer processos educativos de empoderamento das comunidades e organizações sociais, de modo a protagonizar o desenvolvimento e a estreitar o espaço de manobra das elites corruptas e corruptoras.
Ao se viabilizarem por entre os (des)caminhos do Estado como centro das políticas públicas, estes programas tiveram que se adequar às injunções políticas e aos interesses partidários, o que os fez perder parte de seu potencial transformador. Ao conseguirem a efetividade viabilizada pelos setores que controlam a ASA – o que implicou em recursos que, além dos públicos, vieram também de entidades como Sindicato dos Metalúrgicos do ABC Paulista e Febraban (Federação Brasileira de Bancos) –, foram submetidos a um horizonte mais estreito de mudanças. O P1MC enfraqueceu a perspectiva de formação e mobilização e o P1+2 nunca encarou o problema central da terra.
Reforma agrária ainda?
Sendo terra (e poder) o problema, é notório que as lutas pela reforma agrária e pela terra em geral tenham sido uma constante histórica no Nordeste, inclusive no Semiárido. Se bem que as lutas camponesas no Brasil sempre foram por mais que terra, pelo(s) direito(s) – educação, saúde, previdência, condições adequadas e justas de produção e comercialização, liberdade política, etc. –, pela libertação do cativeiro que se perpetuou pós-Abolição no continuísmo das relações de dominação. Mas a situação de desigualdade no acesso a terra e à cidadania quase nada se alterou ao longo dos anos, a despeito de todos os assentamentos feitos em nome de uma reforma agrária que nunca existiu.
O recentemente divulgado Censo Agropecuário 2006 revela que o Nordeste detém o maior número de estabelecimentos rurais (2,4 milhões) e a menor área média (31 hectares). Cerca de 47% destes estabelecimentos têm menos de 10 hectares. Cerca de 90% com área inferior a 100 hectares detêm apenas 27% da área total dos estabelecimentos. Já os com mais de 1 mil hectares representam cerca de 1% do total. Toda a reforma agrária propagandeada por sucessivos governos desde a Ditadura Militar não democratizou o acesso a terra, na região de maior concentração camponesa do país.
A resposta dos camponeses tem sido a resistência na posse quando ameaçada e a luta de conquista de assentamentos da reforma agrária oficial através das ocupações de trabalhadores rurais sem terra. Os movimentos de ocupação em 2008 eram 93, o que denota alta demanda e vitalidade, mas também fragmentação. Ainda que sempre presente, a luta pelos territórios tradicionais – indígenas, quilombolas, fundos e fechos de pasto 10, pescadores e extrativistas, etc. – tem sido maior no período recente. Os povos indígenas silenciados no Nordeste vivem verdadeira primavera de ressurgimento: eram 10 etnias reconhecidas em 1950, passaram a 23 em 1994 e a 37 em 2002. A visibilidade dos povos tradicionais tem a ver não só com afirmação da identidade étnico-cultural e territorial, mas também com as crescentes ameaças por parte dos empreendimentos agrícolas, agroindustriais, minerários e de infraestrutura (barragens, ferrovias, transposição, etc.). “Entraves ao crescimento” foi como o Presidente Lula se referiu às comunidades tradicionais, entre outros 11. A Geografia, principalmente, tem chamado os movimentos do campo como sócioterritoriais, o que amplia para eles o horizonte, o potencial e o desafio. Há razões suficientes para acreditar que o século XXI no Brasil será indígena e negro. E no continente, afroameríndio.
Nos anos 2000 o Nordeste tem concentrado em torno de 1/3 das famílias em ocupações de terra no país, com número bem abaixo e decrescente de famílias assentadas. Segundo os dados da CPT, o Nordeste teve em 2009 (dados até novembro), em relação a 2008, redução no número de conflitos no campo, de ocupações e acampamentos, e, também, no número de assassinatos – 6 para 4 – e de tentativas de assassinato – 11 para 8. Mas aumentaram o número de trabalhadores presos – 8 para 49 – e agredidos – 39 para 89; o de famílias expulsas – 772 para 969; e o de famílias despejadas, de 1.195 para 3.830,  mais que o triplo 12. De par com a criminalização inédita dos movimentos sociais, do campo em especial e do MST em particular, a violência de sempre contra os camponeses não arrefece, antes recrudesce, com o fim de facilitar nova expansão do capital no campo. Não é por acaso que a reforma agrária caiu de pauta e também que 58,9% dos trabalhadores escravizados no campo brasileiro venham da região Nordeste.
A opção desenvolvimentista é pela expansão do agronegócio (90% do crédito público) visando exportação decommodities agrícolas e produção de agrocombustíves, sobretudo etanol de cana-de-açúcar, bem como a expansão da mineração, das barragens e das obras de infraestrutra. O Nordeste Semiárido, além de continuar produzindo mão-de-obra, em conseqüência deste novo ciclo indutor de migração e liberação da terra, contribui sobretudo com fruticultura irrigada, agrocombustíveis e carcinicultura.
Neste quadro, de multiplicação das “vítimas do desenvolvimento”, o que se poderia (e se desejaria) esperar era um acirramento das lutas sociais, e não o seu refluxo. Mas engendrou-se o lulismo.
Lulismo
Mais que a sobrevida, a consolidação do neoliberalismo no Brasil se deu pelas mãos de um governo que, em sua origem remota, significou o seu avesso – o sonho de liberdade, justiça, participação e controle da sociedade e do poder do Estado pelo povo trabalhador. O líder sindical Lula arrematou a construção do consenso conservador pela conciliação das classes, sendo o fiador personalizado de um pacto implícito em que capital e trabalho e massas populares parecem concordar que cada qual tenha sua parte, ainda que o primeiro fique com a maior parte, nada tendo que ser modificado estruturalmente. São emblemáticos, por um lado, o PAC – Plano de Aceleração do Crescimento e, por outro, o Bolsa-Família, o Luz para Todos, a explosão do consumo de massas.
Tem-se chamado de lulismo a esta versão própria do jogo político brasileiro que o Presidente Lula conseguiu articular para controlar o Estado e exercer de fato a Presidência. Por um lado, barganha com os partidos e lideranças fisiológicas da pior tradição brasileira; por outro, mantém a sociedade organizada, em geral, as ONGs e movimentos sociais, em particular, sob controle, através de políticas públicas assistencialistas e pseudo-participativas e fartas em repasse e disputa de verbas.
A facilitação de recursos públicos favorece a tendência de movimentos e entidades em tornarem-se organizações dispendiosas. Alguns movimentos recolhem-se ao âmbito interno da formação de quadros, preparando vanguardas para o momento em que, por força, talvez, de desgaste interno ao bloco do poder, mude a correlação de forças sociais e políticas, tida no momento como desfavorável para um reacenso das massas... A CPI do MST no Congresso visa estancar o fluxo de recursos públicos que subsidia esta estratégia. A atual onda de criminalização quer completar a neutralização do que poderia atrapalhar o expansionismo do capital por sobre territórios. O lulismo joga com maestria as peças deste xadrez.
Cooptação e desmobilização acontecem, por exemplo, com a ASA, que, apesar do potencial de mais de 700 entidades filiadas, acabou perdendo a dimensão de transformação da antiga lógica que continua a reger o Semiárido e se recicla no projeto da transposição, que ela condena, mas não enfrenta nem combate. Certo recuo e disciplinamento acontecem também com os movimentos da Via Campesina, acertadamente dedicados às grandes questões do oligopólio empresarial e tecnológico transnacional na agricultura, mas em geral fragmentados e distantes do cotidiano de luta das comunidades camponesas vítimas do PAC e da expansão do agronegócio e da mineração.
Desafios
Diante deste quadro, em que se acumulam antigas e novas demandas populares, não são poucos os desafios a enfrentar por quem ainda crê na luta e têm vontade de lutar. Se não há condições objetivas para rupturas com o estado de coisas atual, mudança radical de posições – do que se pode duvidar –, são possíveis ao menos passos seguros de recuperação da liberdade e autonomia perdidas, promovidos e promotores da utopia revigorada. Se o tempo é de acumulação de forças, tantas vezes repetimos Florestan Fernandes, mas temos que segui-lo de fato: "Não se deixar cooptarnão se deixar esmagar. Lutar sempre. Conquistar, na luta, vitórias reais com o povo".
Atendo-nos ao âmbito dos aspectos referidos acima, podemos sugerir um elenco, em 13 pontos, dos principais desafios para os movimentos sociais do campo em todo o país e no Nordeste (especificamente os três últimos).
  1. Estabelecer estratégias de autonomização em relação ao Estado lulista, ainda que se continue a receber os recursos aos quais se pode ter por direito, legal e legitimamente, sem o ônus da cooptação, com a transparência que supere o risco da corrupção;
  2. Questionar profundamente a participação nos espaços de construção e controle de políticas públicas, na franja entre Estado e Sociedade, distinguindo atribuições e autonomias;
  3. Ressignificar e revalorizar a reforma agrária, incorporando as dimensões territoriais, étnico-culturais, ecológicas e agroecológicas, a luta pelo limite da propriedade da terra e pela revisão dos índices de produtividade 13;
  4. Intensificar o diálogo e a troca de saberes com e entre experiências de comunidades e territórios tradicionais (indígenas, quilombolas, extrativistas, pescadores, etc.);
  5. Incorporar definitivamente em todas as dimensões e setores da vida e da luta a igualdade de gênero, de etnia e de geração;
  6. Promover e multiplicar iniciativas agroecológicas, que se disseminem e alcancem escala suficiente para disputar os rumos da agricultura e da produção alimentar, impondo-se como a alternativa adequada ao enfrentamento das crises climática e alimentar;
  7. Estreitar relações e intercâmbios de experiências com os movimentos sociais e políticos, camponeses e indígenas, dos países andinos e amazônicos que trilham caminhos mais coerentes com suas raízes étnicoterritoriais e históricas, em perspectiva ecológica (“bem-viver”);
  8. Aproximar as questões agrária e urbana, na prática concreta articulada dos movimentos populares e organizações sociais do campo e da cidade;
  9. Desenvolver estratégias de atração e envolvimento da nova classe média emergente para ampliar a conquista de direitos e transformações sócioeconômicas mais profundas;
  10. Somar forças para uma resistência articulada contra a criminalização dos movimentos sociais e dos defensores dos direitos humanos;
  11. Retomar a radicalidade da proposta de Convivência com o Semiárido, que não contemporiza com soluções compósitas e complementares ao novo ciclo da indústria, da política e da cultura da seca;
  12. Potencializar no Semiárido as experiências de educação contextualizada e para a Convivência;
  13. Denunciar e combater a transposição como estratégia de reciclagem dos antigos esquemas de poder das elites, apoiar as vítimas e antecipar-se no trabalho de base e na comunicação social à questão do custo da água repassado ao povo.
A Via Campesina Internacional, reunida em Jacarta, no dia 6 de novembro, em preparação à participação dos camponeses na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (Copenhagen, 7-18/12/2009), declarou:
As vozes do povo podem entoar muitas diferentes melodias, podem sussurrar ou gritar, cantar ou tocar música, elas falam e debatem. A história dos movimentos sociais nos mostra como os protestos podem também adquirir formas muito diversas. Para a Via Campesina, a desobediência civil foi sempre parte da estratégia, junto de debates, conscientização política e promoção de outras alternativas reais em nosso campo, em apoio à soberania alimentar. (...) Nós achamos que uma democracia sólida só pode se fortalecer permitindo aos povos do mundo que defendam e implementem a justiça climática, a justiça alimentar e a justiça social. 14
Movimentos sociais sem “movimentação” podem ser qualquer coisa política menos “movimento”. Há quem já apregoe o fim de sua era 15. Seja como for, no Nordeste, como de resto em todo o país, expressões como “ninguém pode com governo”, de antigas e angustiantes reminiscências e tantas vezes ouvida da boca de indefesas vítimas da transposição, durante o 3º Mutirão das Águas, soam como escandaloso fracasso da nossa incipiente e débil democracia e um permanente desafio às consciências livres e à recriação permanente da luta social.
Biu da Pacatuba, apelido de Severino Alves Barbosa, foi um dos principais líderes das Ligas Camponesas na Paraíba. O cordel citado pode ser lido em http://recantodasletras.uol.com.br/cordel/1835613.
São centenas de entidades em torno da Frente Cearense Por Uma Nova Cultura de Água e Contra a Transposição, da Frente Paraibana em Defesa da Água, da Terra e do Povo do Nordeste, da Articulação Popular São Francisco Vivo (MG, BA, PE, AL e SE), da CPT – Comissão Pastoral da Terra (MG, BA, CE, PE, RN e PB) e da Diakonia no RN.
Segundo Marilena Chauí, um misto nem sempre contraditório entre conformismo e resistência está na raiz da perpetuação das relações de dominação que marcam o convívio social no Brasil. Cf. Conformismo e resistência: aspectos da cultura popular no Brasil. São Paulo, Brasiliense, 6ª ed., 1994.
Entre o combate à seca e a convivência com o semi-árido – transições paradigmáticas e sustentabilidade do desenvolvimento. Brasília, UNB, Tese de Doutorado, 2006, p. 25, (mimeo).
Op. cit., p. 28.
São formas tradicionais de uso comum da terra, no Semiárido, sobretudo para pastagem, sendo “fundo” quando predominam caprinos e “fecho” quando predomina o gado vacum. Também chamadas “solta” ou “larga”, nomes também usados, porém, mais comuns em outras regiões.
Rudá Ricci, Fim da era dos movimentos sociais brasileirosFolha de São Paulo, 20/10/2009.


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