A hegemonia chegou à Bacia do Rio Salitre

Em primeira instância, hegemonia significa simplesmente liderança, derivada diretamente de seu sentido etimológico (do grego hegemon líder).
O termo ganhou um segundo significado, mais preciso, desenvolvido por Gramsci para designar um tipo particular de dominação. Nessa acepção hegemonia é dominação consentida, especialmente de uma classe social ou nação sobre seus pares.
Historicamente, a Bacia do Rio Salitre é marcada por conflito de água. Em 1978 quando o Brasil passava a conhecer o conflito de terra no Paranapanema (SP), com a organização dos povos do campo pelo MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, na Bacia do Rio Salitre, que pertence ao São Francisco, e se encontra localizada na porção norte do Estado da Bahia em pleno semiarido, com um dos mais baixos níveis de IDH – Índice de Desenvolvimento Humano de 0,542 em cidades que compõem a Bacia, que é comparável a países da África, aconteciam as primeiras mortes pelo conflito de água do país.
As áreas aluvionares da bacia vêm sendo exploradas de longa data com agricultura irrigada. Com o grande aumento da demanda para fins agrícolas, a escassez de água no rio foi se agravando, principalmente no seu trecho final, próximo à cidade de Juazeiro.
Juntamente com a emergência de conflitos violentos pelo uso da água, surgiram várias organizações de pequenos agricultores reivindicando soluções, levando a prefeitura de Juazeiro a construir três barragens sucessivas para reter as águas do rio.
Isso não foi suficiente e posteriormente a CODEVASF, na década de 80, construiu mais seis barragens e as dotou de um sistema de abastecimento por bombeamento em sequência, a partir do rio São Francisco. São as chamadas barragens galgáveis.
Segundo o Cadastramento dos Usuários da Água da Bacia do Rio Salitre, realizado em 2001, através do Convênio CODEVASF/UFBA no contexto do desenvolvimento do Plano de Recursos Hídricos da Bacia, existem 198 propriedades com áreas atendidas pelas barragens galgáveis e uma extensão de 908 ha exploradas com irrigação. O volume total de reservação das nove barragens galgáveis do Salitrinho tem capacidade de 200.000 m3 e o sistema de bombeamento instalado não vem atendendo à demanda dos agricultores para a área irrigável.
Tudo isto deu origem a novos conflitos, o que obrigou o governo estadual a editar, em 1989, a Portaria 077, que limitou a superfície passível de ser irrigada nesta conturbada área, 3 ha por família.
De lá para cá pouco foi feito por este povo. Está acontecendo na Bacia do Rio Salitre a dominação dos Salitreiros pelo Lulismo, que recentemente veio à cidade de Juazeiro inaugurar o primeiro lote do “Projeto Salitre”, com a promessa de irrigar 40 mil ha para servir ao agrohidronegócio, ao grande capital, mas ao lado do Projeto Salitre, os Salitreiros só podem plantar 3 ha pela falta de água no rio.
O lote inaugurado é destinado a pequenos agricultores que tiveram acesso por processo de edital da CODEVASF, que sumariamente excluiu os Saliteiros que continuam convivendo com o histórico conflito por água.
Uma semana antes da entrega dos 255 lotes para famílias de outras regiões, outro conflito acontecia no Salitre quando foram derrubados 5 (cinco) postes de energia elétrica que alimentam as bombas. Como falta água, derrubam os postes da energia, assim os Salitreiros que vivem à montante do incidente não têm energia para captar água do rio e consequentemente os Salitreiros que vivem à jusante passam a ter o rio correndo e podem captar a água que necessitam para sua sobrevivência.
Concluindo o meu raciocínio, que talvez não seja o seu, o mesmo povo que há anos vive no conflito pela água é o mesmo povo que estava batendo palma para o Lula na inauguração do primeiro lote do Projeto Salitre. Eles estão sendo vítimas da dominação por dentro (hegemonia) que quando chega a este nível pouca diferença faz da dominação por fora (coação).
Almacks Luiz Silva é Gestor Ambiental e membro do MPA-BRASIL
Referências Gramsci, Antonio (1926-37) Cadernos da prisão Stillo, Monica (1998) Antonio Gramsci webpage
Salitreiro – Povo que habita as barrancas do Rio Salitre
Lulismo – Defensores de todos os atos e fatos provenientes do governo Lula

Um comentário:

  1. sou salitreira , fico triste em ver que as pessoas estao dominadas ,manipuladas ,sendo vitimas da própria situaçao que lá se encontram ,pela dificuldades se deixam levar por promessas e a cada ano o salitre vai se afundando em profunda miséria .Enquato os políticos usam o povo, com promessas que jamais serao cumpridas, por que eles dependem dessa situaçao para se elegerem.

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