QUANDO PASSADO E PRESENTE SE ENCONTRAM NO MUNDO DAS IDEIAS


Gustavo Mercês (Jacobinense)
Lembro de Robinson, dos tempos quando eu estava iniciando na militância política, onde já no Cefet, então garoto, eu atuava no movimento secundarista empolgado com as teses revolucionárias da Democracia Socialista, que reivindicava a Revolução Socialista Internacional, nos marcos do trotskismo, tendo como referências teóricas figuras com Michel Lowi, Enest Mandel, João Machado e Joaquim Soriano. Abrigado em um coletivo que tinha como expoentes parlamentares: Walter Pinheiro, Heloisa Helena e Neusa Cadore. Discutíamos o drama de ser uma esquerda petista que buscava reafirmar o socialismo e a necessidade de não abrir mão da coerência política na atuação parlamentar. Éramos contra alianças com setores que tinha como histórico o carlismo e o oligarquismo baiano. Não tínhamos chegado ao poder.
O tempo passou, as alianças se ampliaram, o PT agora governa e descontente fui tentar construir um “PT das origens” ou algo parecido, foi assim que ajudei a fundar o PSOL. Nos debates eleitorais deste ano, passado e presente se encontram em um cenário onde só se falava na tal governabilidade e na próspera fase econômica que refletia nos números governamentais.
Aqui pretendo dialogar com o camarada Robinson, hoje dirigente estatal, sem ressentimentos, sem deixar de reconhecer o quanto aprendi com ele, Afonso e Pinheiro, mas também, sem deixar de ousar na confrontação de ideias e rumos, tão necessária em tempos tão confusos dentro da esquerda brasileira. 
 
Inegavelmente bandeiras como ampliação dos direitos sociais, radicalização da democracia, ampliação da participação popular foram bandeiras históricas da esquerda brasileira. Uma esquerda consequente reconhece a necessidade de ampliar do acesso a determinados serviços públicos como cruciais para permitir a construção de uma nova ordem social. Mas o que se coloca em xeque aqui é qual “revolução democrática” pregada e quem são seus maiores beneficiários.
Sem deixar de reivindicar a inconciliável antagonismo de interesses entre capitalistas e trabalhadores, da real impossibilidade de ser governar para todos através de um “pacto social”, a esquerda marxista sempre demonstrou que seria um equívoco histórico transformar o espaço da luta institucional parlamentar como fim para luta política.
Acredito que ao reivindicar a aliança com Otto, histórico carlista, como parte de um projeto de transição histórica da política baiana, fica evidenciada também uma transição ideológica petista que se afasta de vez do internacionalismo socialista e adere a uma onda “moderna” da Social-democracia, agora reformada e que tem como discursos a ampliação do acesso ao consumo e desenvolvimentismo. Discursos que seguem perfeitamente a lógica perversa da Economia de Mercado e a do próprio capitalismo.
Evidentemente que depois de anos de neoliberalismo e recessão econômica que empobreceram nosso país e ampliaram as desigualdades sociais, uma nova etapa de austeridade econômica e estabilização monetária internacional permitiram aos governos federal e estaduais a possibilidade de ampliar as políticas na área social, tão defasadas pelos governos anteriores. Tempos de tranquilidade econômica que permitiram também a ampliação dos lucros das grandes empresas nacionais, principalmente aquelas que se beneficiam dos empreendimentos governamentais.
Assim o PT selou um novo pacto social onde mantêm políticas sociais assistenciais (que não mudam radicalmente o contraste social) sem abrir mão de governar com setores da elite econômica brasileira. Nós ainda acreditamos que para uma verdadeira emancipação social, é preciso que um governo se comprometa com uma inversão concreta de prioridades, tendo como pautas: reforma agrária, financiamento unicamente público da Educação e Saúde, reforma política, reestatização de setores estratégicos da economia, redução da jornada de trabalho sem redução de salário, investimentos sociais sem a limitação imposta pela política econômica fundamentada na garantia dos superávits primários. É desta revolução que prefiro não abri mão. Nada melhor que a própria história para demonstrar onde acertamos e erramos, estando abertos a discutir por quais caminhos a esquerda brasileira deve trilhar nas próximas décadas.
 
*Gustavo Mercês, é comunicólogo, sindicalista e um dos fundadores do PSOL na Bahia.
GUSTAVO MERCÊS

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