‘Denúncia: Biosangue’, o fracasso do biodiesel no Piauí, artigo de Judson Barros




Plantação de mamona. Foto do Centro de Monitoramento de Agrocombustíveis – Repórter Brasil

[EcoDebate] No princípio era biodiesel.

A mamona veio para o Piauí pela mão do Presidente Lulla. O zelo para trazer o grandioso projeto era tanto que parecia coisa de família. Um amigo pessoal, Daniel Birmann, foi o escolhido para por em prática o fenomenal projeto que mudaria as feições do Brasil – produzir azeite de mamona com o objetivo de botar carro pra rodar no Brasil.

O Piauí foi o escolhido para a famigerada experiência. O Governador WD do mesmo partido e amigo íntimo de Lulla ofereceria as melhores condições para a implantação do empreendimento. Foram doadas 40 mil hectares de terras e isenções de todos os tributos estaduais.

A propaganda do negócio foi desmedida: um projeto de reforma agrária foi embutido na divulgação oficial com o objetivo de justificar as isenções e o financiamento estatal – a ludibriação do selo social; 25 mil empregos na região do Gurguéia, uma das mais pobres do Brasil; 700 famílias – parceiras/escravas – somente no projeto Santa Clara, núcleo de produção da mamona.

O Lulla veio para o lançamento da pedra fundamental do biodiesel no Brasil, a maior festa política que já aconteceu no Piauí, discursou e chorou. O povo abobalhado choro junto e acreditou. Venderam seus trecos nas periferias de onde moravam e rumaram para o Santa Clara. A promessa da Buriti Agrícola LTDA (empresa criada pela Brasil Ecodiesel para administrar a fazenda, pois não ficava bem o nome da Brasil Ecodiesel envolvida) era de uma cesta básica e dez reais acima do salário mínimo vigente por conjunto familiar. A promessa durou seis meses. A partir de então a empresa baixou o salário para 150 reais e a cesta não teve mais periodicidade.

Um Contrato de Parceria Rural Agrícola, eivado de vícios e com a finalidade de burlar os direitos trabalhistas foi imposto pela Buriti Agrícola LTDA. Para ver o contrato acesse http://mamonaassassina.zip.net.

As garantias do negócio foram equacionadas com a edição de leis que garantissem a venda do azeite para a Petrobras, iniciando com adição 2 até chegar a 5 por cento. Negócio dos melhores, isenção de tributos federais, estaduais e municipais mais a Petrobras comprando antecipadamente os lotes de azeite. Ainda mais, no Piauí 700 famílias (em média 4 trabalhadores por família) trabalhando quase de graça para a empresa.

As terras doadas para a Brasil Ecodiesel ficaram no nome da empresa Enguia Power LTDA, pois em algum acidente de percurso o nome da Brasil Ecodiesel não seria envolvido. No bojo da discussão das terras os trabalhadores/escravos deveriam receber, depois de 10 anos de trabalho forçado, parte dessas terras – 25 hectares por família. Como são 700 famílias o total seria de 17500 hectares. O restante ficaria para a empresa que recebeu as terras.

Logo no início do projeto, a partir do segundo ano, a Brasil Ecodiesel esqueceu da mamona e iniciou outra atividade clandestina, a produção de carvão com a utilização da madeira nativa. Em três anos quase 50 mil hectares de terras virou carvão. Tudo com o aval do IBAMA e da Secretaria Estadual do Meio Ambiente. Não há notícias de alguma ação do Ministério Público nesse crime.

Em dezembro de 2009 a empresa Brasil Ecodiesel encerrou as atividades no Piauí sem qualquer satisfação à sociedade. A fábrica em Floriano foi fechada e a fazenda Santa Clara foi abandonada. As terras doadas pelo Estado do Piauí estão em processo de negociação para serem vendidas ao INCRA. Negócio bom para a empresa, recebeu as terras de presente e agora vai vender para o Governo Federal. Justificam que vai ser melhor para os trabalhadores.

O INCRA com representantes da empresa e dirigentes sindicais da FETAG já estiveram na fazenda pressionando dos trabalhadores para aceitarem a condição. Os moradores/escravos não concordaram com a proposta, afinal há estão a 5 anos morando no local. No intuito de criar uma situação crítica a Brasil Ecodiesel afirma não tem qualquer responsabilidade com os trabalhadores e que a partir de então o INCRA é que vai tomar de conta.

Os trabalhadores prejudicados e insatisfeitos contrataram advogado no sentido de pleitear os direitos trabalhistas no Judiciário. A Brasil Ecodiesel não deu qualquer satisfação às famílias moradoras do Santa Clara, apenas um administrador da fazenda tem permanecido no local.

A decisão dos trabalhadores de recorrer ao Judiciário ensejou uma onda de ameças e intimidações por parte da empresa. Ameças de corte do salário de 160 reais e da cesta básica como também de despejo das casas onde vivem. “Quem entrar na justiça vai se lascar”, assim brada o chefe da fazenda por nome Pitu.

Por tudo discorrido acima uma certeza é cristalina: “no biodiesel do Piauí tem sangue – sangue dos animais silvestres, das árvores e principalmente das pessoas que há cinco anos estão sendo escravizadas na fazenda Santa Clara da Brasil Ecodiesel”. E não é demais lembrar, tudo com o aval dos governos Federal e Estadual, em particular da Petrobras.

Judson Barros, Presidente da Fundação Águas, PI.

EcoDebate, 26/01/201

Chuva não castiga ninguém

"Deus Pai faz cair a chuva sobre justos e injustos." (Mt 5,45)

Nos primeiros dias de janeiro de 2010, a população brasileira viu-se aterrorizada por notícias da Mídia - Grandes meios de comunicação -,tais como: a) Chuvas castigam o estado do Rio de Janeiro, onde deslizamentos de encostas na Ilha Grande e na cidade de Angra dos Reis fizeram centenas de vítimas, sendo mais de 50 mortos; b) Chuvas em demasia castigam o rio Grande do Sul, onde uma ponte sobre o rio Jacuí,na RS-287, desabou. Muitas pessoas que estavam sobre a Ponte desapareceram. Várias pessoas foram resgatadas e outras continuam desaparecidas; c) Chuva torrencial arrasou o conjunto urbanístico histórico de São Luis do Paraitinga, em São Paulo, onde, inclusive uma igreja centenária desabou.

Esses são estragos provocados pelas mudanças climáticas,eufemisticamente consideradas pela Mídia como "chuvas intensas", e comprovadamente acima das médias regionais, em várias regiões do país.As notícias, acima referidas, deixam claro que não há como se sentir totalmente seguro em vista das mudanças climáticas em curso.Construções de concreto se derretem em vista da força das águas. Tudo o que era de concreto desmanchou como papel diante dos olhos perplexos da população. A conclusão a que chegamos é que não existe mais tecnologia100% eficiente e eficaz diante de tantas mudanças desmedidas nos fenômenos naturais. "Tudo o que era sólido, se desmancha no ar", já alertava Marx no Manifesto Comunista.
Se pensarmos bem, veremos que as notícias veiculadas da forma como referidas acima são grandes mentiras. Primeiro, porque a chuva é benfazeja, cai sobre justos e injustos (Mt 5,45), é reflexo da bondade de Deus, que é infinito amor. Deus rega com a chuva a terra que deu como herança ao seu povo (I Rs 8,36). "Mandarei chuva no tempo certo e será uma chuva abençoada" (Ez 34,26), assim o profeta Ezequiel consola o povo em tempos de exílio e de escassez de chuva. A sabedoria do povo da Bíblia reconhece que Deus solidário e libertador "através a chuva alimenta os povos, dando-lhes comida abundante." (Jó 36,31). Na Bíblia se fala de chuva mais de cem vezes. Até no dilúvio, a chuva é vista como purificadora (cf. Gênesis 6 a 9). Sob o império dos faraós no Egito, a chuva de granizo é vista como uma praga em cima dos opressores e como uma dádiva de Deus que liberta da opressão (cf. Gênesis 9 e 10).

A chuva não castiga e nem desabriga ninguém, apenas revela uma injustiça sócio-econômica e política existente anteriormente. Logo,quem castiga e desabriga, em última instância, é o sistema capitalista que descarta as pessoas e as condena a sobreviverem em encostas e áreas de risco. Quem é atingido quando a chuva chega exageradamente, salvo exceções, são as famílias que tiveram seus direitos humanos - direito à moradia, ao trabalho, à educação, a um salário justo, ao meio ambiente equilibrado e à dignidade - desrespeitados pelo capitalismo neoliberal e por pessoas que adoram o deus capital, o maior ídolo da atualidade.

O falso evangelho (= boa notícia para todos a partir dos pobres) do capitalismo inicia-se assim: "No princípio está o capital. No meio está a concorrência, a competição. No fim está a acumulação, a concentração de renda, de riqueza e de poder." Capital é dinheiro investido para gerar mais dinheiro.

A Campanha da Fraternidade de 2010, com o tema Economia e Vida e com o lema "Vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro" (Mt 6,24) propõe um evangelho para todo o povo e para toda a biodiversidade: No princípio está a vida. No meio, os meios necessários para efetivar a vida. No fim, o bem-estar de todos e tudo. Não apenas a vida do ser humano e nem só de alguns, mas de todas as pessoas e de todos os seres vivos. Logo,urge construir uma sociedade sustentável, onde a preservação dos bens naturais seja o carro chefe e não o crescimento econômico só para alguns.

Um desafio inadiável é percebermos as relações entre as tempestades e o aquecimento global, entre o aquecimento global e o efeito estufa, entre o efeito estufa e a emissão de fases CO2 e outros, entre a emissão de gases CO2 e outros e o modelo industrial vigente (capitalismo neoliberal), entre o capitalismo neoliberal e a mentalidade ocidental conquistadora, e a relação desta com o ser humano, seu Criador e todas as outras criaturas.

Logo, dizer que "a chuva castiga" é reducionismo que esconde o maior responsável por tanta dor e tanto pranto: o sistema capitalista.

Um outro mundo é possível. Um outro Brasil é necessário!

Frei Gilvander Moreira - Carmelita, mestre em Exegese Bíblica, professor de teologia Bíblica, assessor da CPT, CEBI, CEBs, SAB e Via Campesina

povos indígenas e Transposição

Uma delegação dos povos indígenas da região Nordeste do Brasil viajará a Europa para denunciar as violências e as violações de seus direitos decorrentes do projeto da Transposição do rio São Francisco. A delegação indígena estará na Itália, na Suíça, na Bélgica e na França, entre o dia 24 de janeiro e 6 de fevereiro de 2010.

O projeto da Transposição das águas do rio São Francisco tem um impacto socioambiental devastador sobre 33 povos indígenas da região e sobre inúmeras comunidades quilombolas, tradicionais e ribeirinhas. Contrário à Constituição Brasileira, e a tratados internacionais como a convenção 169 da OIT e a Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas da ONU, estas comunidades não foram informadas, consultadas ou ouvidas acerca do empreendimento.

A delegação indígena apresentará as denúncias junto aos órgãos internacionais em defesa dos direitos humanos, como a Organização das Nações Unidas (ONU), a Organização Internacional de Trabalho (OIT), os governos europeus, o Parlamento Europeu e sociedade civil européia.
O objetivo da viagem é pressionar o Supremo Tribunal Federal (STF) para que julgue as ações pendentes, referentes à Transposição, que denunciam as inúmeras irregularidades do projeto e que inclusive questionam se a obra esteja de acordo com a Constituição Federal. Até julgar estas ações, o STF deve mandar parar as obras imediatamente.
Para alcançar este objetivo, a delegação terá audiências com representantes da ONU - particularmente com os relatores especiais de direitos humanos -, da Organização Internacional de Trabalho (OIT) e do Parlamento Européia e entidades da sociedade civil e com a imprensa européia.
Fonte: CIMI

Petrobras vai usar gás que será extraído do aterro sanitário de Jardim Gramacho, RJ

O gás resultante da decomposição do lixo no Aterro Sanitário de Jardim Gramacho, em Duque de Caxias, o maior da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, será usado como combustível. Um acordo assinado ontem (18) entre empresas, a prefeitura do Rio e o governo do estado prevê que 200 mil metros cúbicos diários de gás metano sejam utilizados como fonte de energia pela Refinaria de Duque de Caxias (Reduc), da Petrobras. A empresa Gás Verde processará o gás que será retirado da montanha de lixo. Ela vai separar o gás carbônico do metano. Um duto de 6 quilômetros levará o combustível até a Reduc. A previsão é que a produção se inicie até o final deste ano. Segundo a Gás Verde, a reserva de gás do aterro deverá durar pelo menos 15 anos. O uso do gás, que iria parar na atmosfera, também renderá créditos no mercado internacional de carbono. Segundo o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, parte do dinheiro obtido com a venda do gás será revertida para as prefeituras de Duque de Caxias e do Rio de Janeiro (operadora do aterro), a projetos ambientais e a um fundo para catadores de lixo do aterro sanitário. “O Jardim Gramacho é um dos maiores aterros da América Latina. Durante 30 anos, mais de 9 milhões de pessoas colocaram lixo lá. Isso é um dos emissores de gás do efeito estufa da Região Metropolitana. Ao capturar isso e transformar em gás natural, vamos deixar de emitir centenas de milhares de toneladas de CO2”, disse Minc. Segundo o ministro, essa é a primeira grande ação brasileira de combate ao aquecimento global, desde a sanção da Lei do Clima, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em dezembro de 2009. Segundo a Comlurb, empresa de limpeza urbana do Rio e responsável pelo aterro, o Jardim Gramacho deverá ser fechado em dois anos, mas a produção de gás continuará depois disso, devido ao acúmulo de lixo por anos. Reportagem de Vitor Abdala, da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 19/01/2010

Polêmica Nizan Guanaes: jornalista de Salvador opina

por Alexandra Forbes em 14/01/2010 às 9:44 Bom, o último post deu o que falar: Nizan Guanaes e as coisas que diz geram polêmica, e não é de hoje. Por dessas coincidências da vida, horas depois de ter postado os comentários feitos por ele no Twitter, tive um encontro com uma baianinha esperta, jovem jornalista, chamada Juliana Cunha. Como eu, blogueira - só que o blog dela, Já Matei por Menos, tem uma verve que jamais conseguiria imitar. Um encanto de pessoa. Mais apimentada, culta e sábia do que seu jeitinho de meninota dá a entender. Juliana me contou coisas que para qualquer baiano são obviedades, mas que me deixaram incrédula. O melhor foi descobrir que Nizan já compôs um axé com refrão que diz assim: we are carnaval, we are folia, we are dé wooud of carnaval, we are bahia! Céus. Mas Juliana contou muito mais do que isso, desatou a falar do carnaval da cidade, contando que ao contrário do que a gente pensa, ele não dá lucro algum à cidade, etc e tal. Era tanta coisa que pedi que ela escrevesse um texto, que segue: Depois que o Nizan Guanaes disse que Salvador está out, como a Alexandra falou por aqui, rolou uma comoção baiana chefiada por Bel Marques, vocalista do Chiclete com Banana, um dos maiores blocos do carnaval. A comoção é bastante compreensível: se Salvador está out, o Chiclete com Banana, Ivete, Cláudia Leitte e alguns dos artistas mais rentáveis da música brasileira estão out. Ok, eu, você e todo mundo sabemos que eles ganham mais dinheiro nos milhares de micaretas, festas e shows no resto do Brasil no que no carnaval de Salvador. Acontece que essas pessoas vendem o projeto de uma Salvador onírica, onde o cidadão que passa o ano inteiro sem dar um selinho vai fazer a festa, onde a menina feia é diva e não existem classes sociais. A pessoa pode até ir a um show do Chiclete com Banana sem nunca ter pisado em Salvador, mas realmente não faz sentido que ela vá a esse show se não “acredita” em Salvador. Na minha opinião de jornalista/baiana - e não de especialista em carnaval ou turismo - o problema de Salvador com o carnaval é o mesmo problema de tantas outras cidades com seus lugares, festas e costumes que se transformaram em “produto turístico”: a esvaziação de sentido, de ligação legítima com as pessoas daquele lugar. Eu acredito que uma cidade ou uma festa feita para turistas está fadada ao fracasso. Os próprios turistas vão, aos poucos, sentindo que aquilo não é legítimo. Ok, há coisas que não têm mesmo a pretensão se serem legítimas, mas Salvador não é Dubai. Se o clima da festa que antes era leve, de vários artistas, de vários tipos de pessoas, se torna opressivo, violento com os mais pobres (que são justamente as pessoas que passam o ano inteiro esperando por esse momento e se vêem imprensadas entre os camarotes e as cordas), então perde a graça. A concepção de que o carnaval deveria ser uma das maiores fontes de renda de Salvador, alavancando o turismo e constituindo-se em uma indústria em vez de uma festa popular foi gestada no começo da década de 90. Neste período, o país sofria uma reestruturação que se propunha a identificar e estimular as então chamadas “vocações” de cada região. Dentro desta concepção, o Nordeste servia para agricultura irrigada, cultura e turismo. Se as vocações do Nordeste eram apenas essas três, Salvador precisaria se agarrar às duas últimas com unhas e dentes. O carnaval deixa então o amadorismo e, conseqüentemente, o povo. A ideia de que o carnaval seria o trem da alegria que levaria a Bahia no caminho certo, anestesiou a crítica ao modelo. Para o chefe do departamento de Geografia da UFBA, Clímaco Dias, o grupo que ascendia ao poder estabeleceu uma falsa verdade que vigora até hoje: a de que ser contra a mercantilização do carnaval era ser contra a Bahia. “Até hoje, as pessoas acreditam piamente que ser contra a mercantilização do carnaval é ser contra empregos para a população pobre, o crescimento econômico da cidade ou o desenvolvimento de um mercado fonográfico regional. A discussão fica restrita à possibilidade de ‘melhoria’ do modelo e quase nunca à busca de alternativas para esta direção que a festa tomou, e que hoje talvez seja irreversível”, afirma. Outra lenda que repercurte muito por aí é a de que o carnaval “sustentaria” Salvador. Gente, sinto informar que o carnaval não sustenta sequer a si mesmo. O carnaval não gera recursos significativos à Prefeitura e ao Governo do Estado, freqüentemente gera prejuízo. Em 2007, dos 27 milhões arrecadados pela Prefeitura no mês do carnaval, apenas 5,9% eram referentes às atividades diretamente ligadas à festa. No mesmo ano, a Prefeitura de Salvador conseguiu arrecadar apenas R$ 5,8 milhões de reais, incluindo impostos, licenciamento do uso do espaço público, taxas e cotas de patrocínio. Os materiais publicitários que emporcalharam a cidade renderam míseros R$ 2,9 milhões à Prefeitura. Enquanto isso, as principais organizações privadas diretamente relacionadas ao carnaval conseguiram arrancar R$ 30 milhões dos patrocinadores. Se era ruim com a publicidade, vai piorar sem ela. O carnaval de Salvador deixou de ser um grande atrativo para a publicidade. Em 2007, 228 marcas tinham anúncios nos percurso do carnaval, menos da metade do número de anunciantes de 2003 e 2004. O ISS, que é o imposto mais significativo na festa, rendeu apenas R$ 1,6 milhão. A saber, o ISS é o imposto que incide diretamente pela atividade mais lucrativa do carnaval: os blocos. Eles absorvem a maior parcela da receita estimada do carnaval: R$ 63,3 milhões, e isso apenas com a venda de abadás, considerando que, estranhamente, o Estado não possui acesso às outras fontes de renda dos blocos de trio. O carnaval também não é capaz de solucionar nem de amenizar significativamente a pobreza e o desemprego das camadas populares. Segundo informativo da Secretaria de Cultura do Estado, no carnaval de 2007 foram criados 130 mil postos de trabalho. No entanto, o próprio Governo reconhece que são ocupações efêmeras e mal remuneradas. Algumas delas, como a dos cordeiros, atingem tal nível de brutalidade que, mesmo com o desemprego, os trabalhadores deixam de se submeter. O carnaval é uma festa do mercado para o mercado. E é necessário dizer que, mesmo para o mercado, a maré só anda boa para uns poucos eleitos. Quase 45% do faturamento total dos blocos de trio se concentra em apenas 2% dos blocos, embora, segundo a Secretaria da Fazenda, os blocos mais baratos totalizem 90% das ofertas de abadás e concentrem 70% dos foliões pagantes. Ou seja, os blocos mais caros são pouquíssimos, vazios e enchem as burras de dinheiro. O mais irônico dessa história toda é que essa minha ladainha de números e “carnaval para os pobres” sempre foi repetida pelos chatos da cidade, mas agora quem diz que Salvador está out é um dos gestores da festa, uma das pessoas que vendeu a Salvador onírica.

Energia nuclear é uma boa solução para o Brasil (Nordeste)?

Para responder a questão se "a energia nuclear é uma boa solução para o Brasil (Nordeste)?", caberia discutir se essa alternativa de geração de energia elétrica é econômica, segura e ambientalmente limpa. Esse debate é que temos que fazer com a sociedade. Minha resposta é fácil: NÃO, pelas seguintes razões: Sobre a economicidade dessas usinas núcleo-elétricas, segundo os estudos da EPE (Empresa de Pesquisa Energética), o custo da eletricidade nuclear de Angra 3 ficará em torno de R$ 138/MWh, abaixo dos custos de termoelétricas a gás e carvão importado, e abaixo dos custos da eletricidade eólica (R$ 240) e solar (R$ 1.798). Ainda sobre Angra 3 a Eletronuclear informa que o empreendimento custará R$ 7,2 bilhões, sendo que 70% do financiamento virão de recursos do BNDES e fontes estatais, e os outros 30% de investidores internacionais. As condições de financiamento são controversas, já que a Eletronuclear assumiu uma taxa de retorno para o investimento entre 8% e 10% - muito abaixo das praticadas pelo mercado, que variam de 12% a 18%. Somente um taxa de retorno tão baixa pode viabilizar a tarifa de R$ 138 MW/h anunciada pelo governo federal para essa usina. A operação a baixas taxas de juros revela o subsídio estatal à construção de Angra 3. Estudos têm mostrado que somados juros e financiamento, Angra 3 não sairá por menos de R$ 9,5 bilhões, sem contar R$ 1,5 bilhão gastos até agora.Os subsídios governamentais ocultos no projeto dessa usina nuclear são perversos, porque serão disfarçados nas contas de luz. Se isso se verificar quem vai pagar a conta seremos nós os usuários, que já pagamos uma das mais altas tarifas de energia elétrica do mundo. Também é contestado o prazo de 66 meses estipulado pelo Ministério das Minas e Energia (MME) para a entrada em operação da usina. O governo fez uma estimativa de 30% de progresso já existente em sua construção. Ainda assim, os 70% restantes consumiriam em média pelo menos mais 96 meses, segundo estimativas. A título de comparação de custos, a energia da hidrelétrica de Santo Antônio, foi negociada a uma tarifa de R$ 79/MWh, a hidrelétrica de Jirau, o preço foi de R$ 91/MWh (ambas no Rio Madeira), e o resultado do primeiro leilão de energia eólica no Brasil deixaram o MWh em torno de R$ 148. Bem mais reduzido que o apontado pela EPE para justificar a suposta viabilidade econômica da opção nuclear. Utilizando os R$ 7,2 bilhões alocados para Angra 3, seria possível construir um parque eólico com o dobro da capacidade da usina nuclear (1.350 MW) em apenas dois anos sem lixo radioativo ou risco de acidentes. E também, em termos prioritários de como utilizar esse "dinheirão", dados do Procel (Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica), mostram que cada R$ 1 bilhão empregado em programas de eficiência energética resulta em uma economia na potência instalada de 7.400 MW, o equivalente a 5,5 vezes a potência de Angra 3 ou a metade de Itaipu. Logo, se uma usina nuclear custa mais de R$ 7 bilhões, pode-se concluir que cada R$ 1 bilhão investido em eficiência pode evitar investimentos de até R$ 40 bilhões para gerar a mesma quantidade de eletricidade nuclear. Portanto construir usinas nucleares no Brasil só será possível por meio de um verdadeiro saque aos cofres públicos. E, podemos considerar que a médio e longo prazo, o desvio de recursos públicos para a opção nuclear será um verdadeiro obstáculo ao estabelecimento de políticas de incentivo e promoção de energias renováveis no país. Quanto à questão da segurança, apesar dos renovados esforços da indústria nuclear em apresentar-se como segura, acidentes em instalações nucleares em diversos países continuam a demonstrar que esta tecnologia é perigosa, oferecendo constantes riscos que podem trazer conseqüências catastróficas ao meio ambiente e à humanidade. O exemplo mais recente foi o acidente pós-terremoto em julho de 2007 (6,8 na escala Richter) na maior usina atômica do mundo, localizada em Kashiwazaki-Kariwa, no Japão, que provocou, além do vazamento para o mar, a emissão de gás radioativo para a atmosfera. Não podemos nos esquecer dos incidentes graves com reatores: Chernobyl (Ucrânia) e Three Milles Island (EUA). O primeiro ocorreu em abril/1986, com a explosão de um dos reatores possibilitando que uma nuvem radioativa cobrisse todo o centro-sul europeu. E em Three Milles Island em março/1979, que provocou grande extensão de danos, mas sem vítima nem vazamento de radiação para o ambiente. Acidentes em uma usina nuclear tem baixa probabilidade de ocorrência, mas quando ocorrem são de extrema gravidade em termos tanto dos impactos sobre a saúde humana quanto ao meio ambiente. Do ponto de vista ambiental, afirmar que as centrais nucleares são "limpas" quanto à emissão de gases estufa é uma desinformação imensa, sobre a tecnologia dessas centrais e sobre as condições em que funcionam as etapas da cadeia de obtenção e de processamento do combustível que alimenta as usinas. Em operação rotineira, as centrais nucleares pouco agridem o meio ambiente, porém expõem a sociedade ao risco de acidentes que liberam na biosfera produtos de fissão de alta atividade, que podem trazer conseqüências catastróficas. Embora pequeno tal risco, existe, e não pode ser negligenciado. Ademais, essas usinas não resolveram o problema dos rejeitos de alta atividade, cuja deposição final demanda pesados investimentos. Estima-se que estes rejeitos tenham que ficar isolados durante 10 mil anos. Os defensores desta tecnologia não incorporam em seus cálculos de emissões de gases estufa, o processo completo da produção da eletricidade, o chamado ciclo do combustível nuclear. Pois, se consideramos a mineração do urânio, o transporte, o enriquecimento, a posterior desmontagem da central e o processamento e confinamento dos rejeitos radioativos, esta opção produz entre 30 e 60 gramas de CO2 por kWh gerado, segundo dados da Agência Internacional de Energia Atômica. O cálculo que faz o Oxford Research Group chega a 113 gramas de CO2 por kWh. Isso é aproximadamente o que produz uma central a gás. No caso do enriquecimento para obtenção do combustível nuclear, os minérios que contém o metal pesado Urânio são complicadíssimos de serem "beneficiados", produzindo gases estufa em todas as etapas. Para obter o Urânio enriquecido que interessa aos reatores (3% enriquecido do isótopo 235), teríamos que rejeitar 970 kg de materiais para cada 30 kg de urânio físsil obtido. Para isso, se gasta uma enormidade de energia, inclusive na forma de vapor de água e de eletricidade produzidas em termoelétricas convencionais - grandes produtoras de CO2, de vapor de H2O e de gases nitrogenados -, e em hidroelétricas. Portanto, aqui também tem um mito, um afã de descartar, cortar e mostrar uma parcialidade da realidade desta energia. Também, o uso de água na tecnologia nuclear é alto. Então, a análise deve considerar a quantidade de energia que colocamos de antemão para produzir a energia elétrica. É importante não omitir esses dados no debate sobre as soluções ao desafio energético do país. E aí cabe mais uma mentira: a de que hidroelétrica não emite gás estufa. Basta pensar que as represas, sobretudo em regiões quentes e áridas ou semi-áridas evaporam muito, e de novo teremos o vapor H20, e também o gás metano emanado da decomposição de matéria orgânica, nas represas que cobriram muita vegetação e camada de húmus. A insistência em considerar a eletricidade nuclear como uma "fonte limpa" é tão grave quanto considerar a hidroelétrica em geral como renovável e não "poluidora". Além das questões econômicas, de segurança e ambientais, existem questões éticas que não se deve deixar para as futuras gerações a resolução de problemas da época presente. E isso está ocorrendo com os depósitos (ainda relativamente pequenos) de rejeitos de alta radioatividade (lixo atômico) que permanecem em piscinas nas proximidades dos reatores. Além de que a construção de novas usinas nucleares é sempre uma porta aberta para a possibilidade de produzir artefatos nucleares para fins militares, e para o uso não pacífico dessa tecnologia. O que a sociedade brasileira condena e não aceita mais é a falta de transparência sobre as escolha das opções energéticas, impedindo que tenha informações, e se manifeste, sobre como e onde seu dinheiro está sendo investido. Os custos econômicos, ambientais e sociais de usinas nucleares no Brasil (Nordeste) são altíssimos, e nada pode explicar tanta insistência com projetos tão desnecessários para o país e tão ineficazes em termos de geração de energia elétrica. O debate energético atual se baseia em um modelo "ofertista" com recursos fósseis, com mega-hidroelétricas e com usinas nucleares. Ele precisa e deve ser substituído por um projeto diferente, contemporâneo dos desafios e possibilidades do século XXI, para que tenhamos segurança energética em longo prazo, com a diversificação e a complementaridade da matriz energética nacional, e com fontes renováveis de energia, levando assim em conta, um modelo de desenvolvimento sustentável. Heitor Scalambrini Costa - Professor associado da Univ. Fed. de Pernambuco, graduado em física pela Univer. Est. de Campinas, mestrado em Ciências e Tecnol. Nucleares, na Univ. Fed. de Pernambuco e doutorado em Energética, na Univ. de Marselha/Comiss. de Energia Atômica

José Truda Palazzo Jr. é jardineiro e indignado

Fui um dos trouxas que aplaudiu a entrada de Carlos Minc no Ministério do Meio Ambiente. Apesar de sabê-lo viajandão e performista, sempre o achei honesto, e me parecia que poderia ser um gestor mais combativo depois de termos visto a Senadora Marina Silva fazer um papelão como ‘soldada de Lulla’, engolindo todo tipo de crimes estatais e desaforos do Einstein de Garanhuns e sua ungida Candidata Plástica da Casa Civil, ambos inimigos declarados e ferrenhos da conservação da biodiversidade brasileira, ele por ignorância pura, ela por interesse econômico mesmo. As semanas que passaram, com nosso Minc-nistro centrando seus shows de colete na já falida e insuficiente Conferência de Copenhague sobre o clima, mostrou que Minc aprendeu rápido - e infelizmente muito bem - a fazer o papel de ventríloquo das barbaridades palacianas. De esperança de uma gestão mais prática e útil no MMA, virou apenas mais um político a mirar as eleições de 2010 para segurar o palanque sujo de Dilma, Musa dos Empreiteiros e das emissões de carbono desenfreadas do “agronegócio” medieval que infesta o país. Enquanto a delegação brasileira serviu de background folclórico em Copenhague para os desfiles da outra Musa do Atraso nacional, a senadora-latifundiária Kátia Abreu, e se desvela em auto-congratulações sobre “metas” de redução futura de emissões absolutamente mentirosas – eis que sabemos muito bem qual o grau de cumprimento de metas, leis e controles ambientais aqui em Pindorama – o mesmo Minc que adota na área ambiental internacional o discursinho ufanista, quase nacional-socialista, de Lullão Metralha et caterva, apoia aqui na imprensa doméstica uma das maiores falcatruas ambientais E fiscais já perpetradas contra o Brasil, na forma do decreto lullesco que empurra com a barriga as multas para os fazendeiros que comeram ilegalmente a reserva florestal legal e seguem se recusando a registrar suas áreas de preservação obrigatória, certos que estão de que, enquanto a atual troupe pró-desmatamento dominar o Planalto, nada tem a temer. O custo da brincadeirinha eleitoreira e arrecadatória de doações de latifundiários para a campanha 2010: 10 bilhões de reais não arrecadados dos criminosos ambientais do campo. Chore, trouxa: é do seu bolso que está saindo esse subsídio à continuidade da sem-vergonhice de quem tem milhares de hectares e se recusa a deixar uma mixaria de terra reservada à continuidade do que resta de biodiversidade em nosso pobre, estuprado país. Melhor que isso, só se o des-governo Lulla Roussef tentar encomendar um cartaz a Ziraldo no estilo daquela bela campanha anti-fumo, mas que agora diga: Preservar é Brega. É assim – com uma retórica semi-coitadinha, semi-ufanista sobre como somos maravilhosos em prometer cortes futuros de emissões, mas como necessitamos meter a mão no erário do contribuinte de país alheio para fazê-lo – que nosso des-governo perpetua uma fraude de tamanho global, fingindo ao mundo que se importa e adota medidas sérias de controle das emissões de gases-estufa e do desmatamento, enquanto aqui dentro segue sendo cúmplice da destruição acelerada da Amazônia e demais ambientes naturais, sendo uma sucursal dos arrotos de metano das vacas de Kátia Abreu e do vômito de carvão das termelétricas de Eike Batista. Conseguimos a façanha de fingirmos compromisso no exterior enquanto aqui transformamos o Estado nacional em sucursal dos interesses provados mais daninhos ao planeta que já se viram florescer à sombra dos palácios brasilienses. Nosso Minc-nistro, muito estimulado pelo efeito psicotrópico dos holofotes estrangeiros, não se contenta em fazer essa dupla face de posar de bonzinho lá fora e de defensor do escangalhamento florestal no Brasil aqui dentro. Não! Ainda sobra em críticas às propostas mais moderadas de compartilhar a responsabilidade financeira do dano planetário das mudanças climáticas, com um papinho-goiaba de que apenas os ‘países desenvolvidos’ devem contribuir a um fundo global de mitigação do apocalipse em que nos atiramos no futuro próximo. Ora pois, não somos “os caras”, não somos um país que “chegou lá”, que superou tudo e todos para sentar-se à mesa dos reis? Então por que não temos coragem, vergonha na cara, hombridade para assumir o tamanho do estrago que as queimadas, as fazendas mal geridas e o péssimo uso e produção porca de energia do Brasil causam ao planeta? Isso sem falar no estrago em nossa própria biodiversidade causado pelas “limpas” hidrelétricas e monoculturas de biocombustível, mas querer falar nisso para a delegação de políticos brasileiros em Copenhague já é exigir neurônios demais dessa gente… Minc, que como Marina tinha um belíssimo histórico de militância ambiental parlamentar, será, certamente, candidato de novo a qualquer coisa no Rio de Janeiro. Deve resultar eleito, a qualquer coisa, já que o eleitor provou ad nauseam que valoriza mais a performance que o conteúdo. Mas é uma pena que assim seja. Ele tinha autoridade para ser um Ministro sério e independente, e, ao contrário de Marina que –mesmo tardiamente - teve a coragem de denunciar as pressões e tomar outro rumo, vai aos palanques carregando essa sina de ter sido testa-de-ferro do lullismo anti-ambiental até o fim. Caiu por terra também esta semana, em definitivo, o discurso caudilhesco de Lullão Metralha sobre a suposta “liderança” do Brasil no mundo em desenvolvimento e no tema de mudanças climáticas entre os países mais desfavorecidos. É só se ver o escândalo legítimo feito por Tuvalu contra o Brasil, parte do protagonismo corajoso dos pequenos países insulares em Copenhague, para ver que a “solidariedade” lullesca se restringe a golpistas fracassados em Honduras e mandaletes semi-analfabetos das miseráveis republiquetas que nos cercam. O mundo em desenvolvimento não pediu, não endossou e não quer que o Brasil do des-governo pró-desmatamento e pró-continuidade do aquecimento global o represente. Tenhamos, ao menos, a sobriedade de passar vexame sozinhos em Copenhague, sem tentar arrastar à lama outras nações pobres, porém honestas. E, agora que essa conferência do absurdo terminou, ao menos leiamos o que diz a imprensa internacional, e não só os releases goebbelianos de Brasília. Quem sabe assim poderemos dizer aos nossos filhos de quem é a culpa, aqui mesmo em terras bananeiras, do futuro deles ser tão ruim. Email: palazzo@terra.com.br Fonte: O Eco.

2009: um ano com gosto de café requentado! artigo de Eloy Casagrande Jr.

É inevitável, chegamos próximos da virada de ano e olharmos para os doze meses que se passaram, tentando entender nossos passos, os passos dos outros, os passos do mundo. Vimos uma gripe mudar de nome, de suína à H1N1, matar milhares de pessoas, para depois sabermos que não passava da gripe espanhola de 1918, requentada! O ser-humano quer gastar milhões de dólares em viagens turísticas espaciais e sonha em tirar água de Marte, mas ainda não é capaz de controlar o vírus de uma gripe já conhecida. Sem dúvida alguma, as prioridades da ciência devem ser repensadas. Também vimos uma crise econômica sem precedentes passar. Tsunami para alguns, marolinha para outros! De acordo com o FMI, 10 trilhões de dólares saíram dos cofres públicos para não deixar bancos, seguradoras e montadoras de automóveis quebrarem. O capitalismo requentou o socialismo quando lhes foi conveniente! A pergunta que fica sem resposta é se alguém viu alguma mudança no controle da especulação financeira, depois da crise, conforme as promessas no meio da crise? Michael Jackson se foi, mas o “thriller” é o mesmo! Como diz a letra: ‘Cause this is thriller, thriller night. There ain’t no second chance, against the thing with the forty eyes, girl. Thriller, Thriller night!’ — ‘Porque isto é terror, noite de terror. Não há segunda chance, contra a coisa com quarenta olhos, garota. Terror! Noite de Terror!’ Em 2009, se comemorou vinte anos da queda do muro de Berlim, que separou famílias na Alemanha por quase trinta anos. Por outro lado, Israel constrói outro muro, isolando terras férteis na Cisjordânia e impedindo que palestinos tenham acesso a água, comida e o direito de ir e vir. Com quase 300 km extensão e declarado ilegal pela Corte Internacional de Justiça (ICJ), a sentença foi ignorada por Israel. Ironicamente, vimos neste final de ano, o roubo e a recuperação da placa com a inscrição “Arbeit macht frei” (“O trabalho nos faz livres”), que ficava na entrada do antigo campo de extermínio nazista de Auschwitz, na Polônia. A memória de um tempo sombrio onde liberdades eram restritas e se matavam pessoas pelas suas crenças e raças! O muro na Terra Santa é um símbolo requentado, pois encobre as atrocidades cometidas na região pelo superior poder bélico israelense. O escritor português, José Saramago, ganhador do Prêmio Nobel de Literatura, confronta Israel com a verdade histórica: “O que está acontecendo na Palestina é um crime que podemos comparar com o que ocorreu em Auschwitz”. Do lado rico do Planeta, tivemos momentos de esperança, com a eleição de um presidente negro da maior economia do mundo, apontado como um paladino do bem, se contrapondo ao seu antecessor, George Bush, o senhor da guerra. No entanto, Barack Obama decepcionou a todos ao aumentar a ofensiva americana no Afeganistão, logo após ganhar de prêmio Nobel da Paz. Também na maior conferência do ano para conter as mudanças climáticas, se omitiu de assumir metas de redução nas emissões dos Gases do Efeito Estufa (GEE). Ele não estava sózinho na COP 15, em Copenhage, já que grandes poluidores como a China e países produtores de petróleo, também fizeram de tudo para que compromisso algum fosse assumido. Requentaram o que já estava quente! Segundo um relatório do Fórum Humanitário Global (FHG), as mudanças no clima já matam cerca de 315 mil pessoas por ano, de fome, doenças ou desastres naturais, e o número deve subir para 500 mil até 2030. Grande parte dessas mortes ocorrerão na África, sendo que o continente representa menos de 4% às emissões globais de GEE! Obama traiu sua origem africana. Este sentimento está sintetizado na frase do primeiro-ministro etíope Meles Zenawi, o negociador-chefe dos 53 países membros da União Africana, que declarou – “o fim do Protocolo de Kyoto significa a morte da África”. Ironicamente, a avó do presidente dos Estados Unidos, Mama Sarah, terá melhor qualidade de vida com as placas para gerar energia solar instaladas pelo Greenpeace, em sua casa em Kogelo, no Quênia! Na COP 15 também esteve Arnold Schwarzenegger, mostrando as regulamentações de controle de emissões implantadas no estado da Califórnia, onde governa e promentendo mais do que presidente do seu país. O ex-ator de cinema ficou bem na fita, enquanto Obama pode representar o verdadeiro “exterminador do futuro”! Em tempo, o estudo “Caminhos para uma Economia de Baixa Emissão de Carbono”, da McKinsey & Co, que teve a WWF (Fundo Mundial para a Natureza) como um dos patrocinadores, demonstra que até 2030, energias solar, eólica e de outras fontes renováveis poderiam contribuir com até um terço de toda a demanda global; eficiência energética poderia reduzir as emissões de gases de efeito estufa em mais de um quarto; e as emissões oriundas do desmatamento de florestas tropicais – atualmente um quinto das emissões globais – poderiam ser praticamente eliminadas. E tudo isto a um custo de menos de 0,5% do Produto Interno Bruto Global. Enquanto isto, no país do futuro, vimos nosso presidente ser apontado como o “cara”, personagem global do ano! País emergente, agora o Brasil está entre os dez mais, capa do Financial Times, é a bola da vez! Se por um lado há o brilho, por outro, há corrupção requentada, que vai dos mensalões as meias e cuecas do Distrito Federal, um lado sórdido da política brasileira que insiste em permanecer. Promessas são muitas, de conter desmatamento à reduzir as mazelas sociais, de mais educação, moradias e menos criminalidade. No entanto, a cada dez horas uma criança é assassinada no Brasil, segundo o NEV (Núcleo de Estudos da Violência, da USP). É o tempo deste texto chegar no editorial do jornal e ser impresso. Em ano eleitoral, precisaremos mais do que frases de efeito e promessas de palanque requentadas para mudarmos esta realidade! A ministra da casa civil, Dilma Housseff, chefe da delegação brasileira na COP15, precisa estudar mais a cartilha ambiental para não cometer gafes como declarar ao mundo que “o meio ambiente é uma ameaça ao desenvolvimento sustentável”! Aproveitando uma mensagem de natal enviada virtualmente por um um amigo, deixo aos leitores o pensamento lúcido e esperançoso de Carlos Drumond de Andrade: Quem teve a idéia de cortar o tempo em fatias, a que se deu o nome de ano, foi um indivíduo genial. Industrializou a esperança, fazendo-a funcionar no limite da exaustão. Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos. Aí entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez, com outro número e outra vontade de acreditar que daqui para diante vai ser diferente. Que dois mil e dez não tenhamos gosto de café requentado, novamente! Eloy Casagrande Jr., PhD Coordenador do Escritório Verde e Professor da Universidade Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR (eloy.casagrande{at}gmail.com) EcoDebate, 04/01/2010

O projeto econômico de Lula e Serra é o mesmo. Entrevista especial com Leda Paul


A economista Leda Paulani concedeu ao IHU On-Line a entrevista que segue. Nela, a professora analisa o desenvolvimento da economia brasileira nos últimos anos, trazendo dados importantes como a passagem do primeiro para o segundo mandato de Lula, a crise econômica, as perspectivas para 2010 e a atual taxa cambial brasileira. "Dada a forma que a sociedade se organiza hoje, se simplesmente desacelerar o crescimento no mundo todo, se joga bilhões de pessoas na miséria. É uma contradição enorme. Como vai se defender, num país como o Brasil, que o país não cresça mais?", disse ela na entrevista que concedeu por telefone.
Leda Paulani é doutora em Teoria Econômica pelo Instituto de Pesquisas Econômicas da universidade de São Paulo. Em 2004, recebeu o título de Livre-docência da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, onde, atualmente, é professora. É presidente da Sociedade Brasileira de Economia Política e pesquisadora Sênior da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas. Escreveu Lições da Década de Oitenta (Sao Paulo: EDUSP, 1995), A Nova Contabilidade Social (São Paulo: Editora Saraiva, 2000), Modernidade e Discurso Econômico (São Paulo: Boitempo Editorial, 2005) e Brasil Delivery: Servidão financeira e estado de emergência econômico (São Paulo: Boitempo Editorial, 2008).

Confira a entrevista.

IHU On-Line - É possível que a economia brasileira alcance, em 2010, o padrão de crescimento da China?
Leda Paulani - Creio que não. Os 8% que a China cresceu esse ano? Não. Deve ficar, se nada acontecer, perto dos 4,5%.


IHU On-Line - O que explica, no caso brasileiro, a rápida retomada do crescimento logo após a grave crise econômica internacional?
Leda Paulani - Na realidade, a economia brasileira já vinha com uma aceleração do crescimento por conta desse aumento da oferta de crédito para a população de renda mais baixa, o crédito consignado, e o aumento do salário mínimo real. Tudo isso fez o mercado crescer. O consumo estava crescendo, o investimento estava, ainda que pouco, reagindo. A economia vinha nesta toada e a crise deu uma "brecada" nisso. Agora, passada essa fase mais aguda da crise, o crescimento foi retomado em função dessas variáveis, que já estavam colocadas desde antes da crise.


IHU On-Line - Diante da atual taxa cambial brasileira, podemos dizer que estamos diante de uma excessiva valorização do real diante do dólar?
Leda Paulani - Esta é uma questão muito controversa. Sempre há quem diga que não há taxa de câmbio  tecnicamente correta. Eu não concordo com isso. Acho que um país como o Brasil teria que tomar cuidado com esse preço, que é extremamente importante. Se nossa moeda se valoriza demais, como vem acontecendo, começamos a perder mercado interno e externo. Outras conseqüências num médio prazo podem advir daí, como a desindustrialização etc. Acho que, como a moeda brasileira vem de um processo de quase cinco anos de valorização ininterrupta, não podemos dizer que não há conseqüências.


IHU On-Line - O BNDES tem fornecido sucessivos aportes de recursos. Qual é o papel que o banco joga hoje na estratégia do governo?
Leda Paulani - O BNDES é um instrumento múltiplo, pode ser utilizado de várias formas e, para o governo brasileiro, é um privilégio ter um instrumento como esse. O banco tem um papel importante porque pode, num contexto de retração completa do crédito, acabar melhorando um pouco essa situação, tornando-a menos drástica. Por outro lado, ele também pode ser usado, como foi, por exemplo, na época das privatizações do governo FHC, para financiar os compradores das empresas estatais brasileiras.

IHU On-Line - Pode-se falar em um "Lula 2", a partir do segundo mandato, sob a perspectiva da política econômica?

Leda Paulani - Se compararmos a segunda gestão com a primeira, digamos que há o chamado desenvolvimentismo ou políticas desenvolvimentistas que começaram a ter um espaço nesse segundo período. A crise, de certa forma, acabou praticamente exigindo esta mudança de postura do governo. Se o governo tivesse se mantido durante a crise com a mesma postura que tinha no primeiro mandato, a crise teria sido muito profunda aqui no Brasil.


IHU On-Line - Como a senhora avalia as teses de que o crescimento econômico progressivo, a obsessão em aumentar o PIB, está na contramão da crise climática?
Leda Paulani - Acho que esta tese é absolutamente correta. A lógica do sistema capitalista é contrária a qualquer uso racional dos recursos naturais, simplesmente porque, para o sistema, quanto mais vende melhor. Mesmo para o trabalhador isso também é verdade, pois o emprego depende disso. Na realidade, a vida da maior parte das pessoas do planeta depende do sucesso dos negócios capitalistas. Um exemplo: uma pessoa pode ter quatro pares de sapato, seria o suficiente para ela ter satisfeitas suas necessidades de agasalhar o pé. Porém, evidentemente, que para quem produz sapato o interessante é essa pessoa ter 40 ou 400 sapatos, ainda que para viabilizar a produção nesse nível se tenha que destruir muitos recursos naturais, alterar o clima ou produzir gases tóxicos. Então, essa tese é absolutamente verdadeira. Acho que esta questão ambiental vai se tornar cada vez mais a grande questão a ser discutida. Como se acomoda a lógica do sistema capitalista, levando em conta o capitalismo global, com a finitude dos recursos do planeta?


IHU On-Line - A partir disso, o mundo deveria de fato desacelerar o crescimento econômico?
Leda Paulani - Dada a forma que a sociedade se organiza hoje, se simplesmente desacelerar o crescimento no mundo todo, bilhões de pessoas serão jogadas na miséria. É uma contradição enorme. Como vai se defender, num país como o Brasil, que o país não cresça mais? E os milhões e milhões de pessoas que não tem outro jeito de viver a não ser arrumando emprego? Este é o grau da contradição.


IHU On-Line - Como a senhora vê a opção brasileira em investir pesadamente em matrizes energéticas que exigem enormes estruturas: hidrelétricas, nuclear e o pré-sal?
Leda Paulani - Acho que energia é um bem estratégico, então o governo de cada país tem a obrigação de cuidar de seu abastecimento energético. Já vivemos dois apagões para saber como é complicado quando essas coisas falham. Evidentemente que hoje, tendo em vista este cenário de problemas ambientais cada vez mais agravados, tem que se procurar as fontes menos poluidoras e gerar energia da forma menos poluidora possível. O Brasil, neste ponto, é privilegiado porque tem "n" quantidades de água e pode produzir energia hidrelétrica, que é muito barata para o país e polui muito menos que a energia térmica, por exemplo.
Nós também temos a possibilidade do etanol, mas aí já existem uma série de outras conseqüências. Com relação ao pré-sal, a questão é que o mundo ainda vai continuar precisando de petróleo durante muito tempo, e por mais que seja muito mais caro extrair petróleo nessas camadas, ele vai se viabilizar economicamente. Para o Brasil isso não é ruim, a não ser pelo fato de que se pode, por conta de se tornar um país exportador de petróleo, acabar sofrendo daquilo que chamamos, na macroeconomia, de "Doença holandesa", e acabar só produzindo petróleo e se tornar dependente de produção externa para tudo mais. Isso acontece com os países produtores de petróleo hoje, tanto os árabes quanto a Venezuela, por exemplo.


IHU On-Line - Estaríamos ainda presos a uma concepção de desenvolvimento tributária da sociedade industrial?
Leda Paulani - Sim, com certeza. O padrão de vida e sociedade que temos hoje ainda está moldado à indústria, a grande revolução do Ocidente no final do século XVIII. Isto pauta tudo, até hoje.


IHU On-LineI - O governo está mais ‘desenvolvimentista’ e menos ‘monetarista’?
Leda Paulani - Eu diria que o governo está mais desenvolvimentista, mas não diria que está menos monetarista. Acho que o governo ainda tem uma postura muito conservadora e nossa taxa de juros ainda é uma das mais elevadas do mundo. Nossa taxa de juros caiu, só que na maior parte do mundo desenvolvido as taxas de juros são praticamente negativas, então nossas taxas de juros ficam extremamente atrativas, para o capital estrangeiro, por exemplo. As taxas de juros foram realmente muito elevadas e continuaram elevadas, apesar da queda em termos absolutos. Não diria que o governo está menos monetarista. Está mais desenvolvimentista, mas não é contraditório continuar a ser monetarista, de certa forma.


IHU On-Line - Pensando 2010, a senhora vê diferenças entre o projeto econômico de Serra e Dilma?
Leda Paulani - Não, nenhuma diferença. Para mim é o mesmo projeto há muito tempo. Quando o Lula se elegeu pela primeira vez, se imaginava que seria outro projeto, mas não era verdade, e cada vez mais está ficando claro que é o mesmo projeto. São administrações competentes da realidade capitalista, num contexto de transformações mundiais, mas não acho que tenha realmente nenhuma diferença substantiva.


* Instituto Humanitas Unisinos

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